(Sim, sei, vocês não sabem de que estou falando porque a beleza desapareceu há muito tempo. Ela desapareceu sob a superfície do barulho - barulho das palavras, barulho dos carros, barulho da música - no qual vivemos constantemente. Está submersa como a Atlântida. Dela só restou uma palavra cujo sentido é a cada ano menos inteligível.)
[Milan Kundera]

terça-feira, 4 de agosto de 2009

E tranquila.


E o único dom que te deram, homem,
Transformas-te em maldição.

Fizeste da tinta negra o sangue
E da canção o fim das cordas
Do instrumento musical.

Escreveste o vitória das hordas
De bárbaros negros sobre cidades
Destruídas.

Criaste, com a tua pena, homem,
Um mundo de desespero e desamor.
E isso tudo, escritor saudoso,
Com tua letra fina, doce, aérea, plácida
E tranquila.

É proibido, te gritou o Céu,
Escrever.
É proibido dar a conhecer
A magia que jaz em cada letra.

Tu escreveste, homem,
E amaldiçoas-te, por isso, a raça humana.

E tudo isso com tua pena leve,
Com tua tinta branca,
Com tua letra fina, doce, aérea, plácida
E tranquila.

E este diamante de tortura
É o que tens de mais precioso em ti.
É o teu coração, um grande cristal de rocha
Que deixa passar a luz, e retém a sombra do mundo.

Nenhum comentário: