(Sim, sei, vocês não sabem de que estou falando porque a beleza desapareceu há muito tempo. Ela desapareceu sob a superfície do barulho - barulho das palavras, barulho dos carros, barulho da música - no qual vivemos constantemente. Está submersa como a Atlântida. Dela só restou uma palavra cujo sentido é a cada ano menos inteligível.)
[Milan Kundera]

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Despercebido

(Finais de 2007)


Era como se não
tivesse sido jamais
(O. Montenegro)

Os beijos, as cartas, as canções
Era como se nunca tivessem existido
E o amor que devotávamos a nós
Passou assim, como que despercebido.

A vontade, a sede, a ânsia, a devoção,
Cada gosta indefinida de paixão
O tremor, a coragem, o agarrar das nossas mãos
“Nunca houve”, sussurra o coração.

E a energia que movia nossas noites e manhãs
Cessou, quando quiserdes, de existir.
Mas também cessou meu mais sincero choro,
E, rimando, meu mais sincero rir.

E no passar do tempo deixei ir
Toda a magia que antes nos sentíamos
E se ia toda minha alegria,
Com todos nossos beijos, nossos risos.

E um dia acordei aliviado,
Respirei e deixei a vida entrar.
Era morto eu e o passado
Quando me atrevi a nos lembrar.

Era morto cada nada e cada isso
Cada pouco e cada sempre de nós dois
E como Cristo que do pútrido nasceu
O nosso amor renascerá depois.

Mas enquanto não é assim,
Enquanto tenho de esperar,
Que nada seja como foi.
Ou que seja como se não há.

Enquanto tenho que ver passar o tempo,
E esquecer o que já te é esquecido,
Que todos os teus risos passem sérios,
E o meu tremor passe, assim, despercebido.

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